Fouclori
O Boi D’água
Lúcio Alves Oliveira
cachorro, pois tal criatura hora deitava se rolando pelo chão, hora se levantava
fazendo movimentos brutos como se estivesse rasgando alguma coisa.
_ Imaginando que talvez aquela criatura estivesse precisando de ajuda, o
homem puxou a rédea do cavalo diminuindo suas passadas, e aos poucos foi se
aproximando com os olhos fitados naquela criatura que sem perceber a
aproximação do cavaleiro, foi então surpreendido ao escutar:
_ Vire-se ou eu atiro.
_ A Criatura assustada se virou de uma só vez suplicando:
- Por favor, compadre, não atire. Sou eu!
_ Ouvindo isto o homem que estava a cavalo fitando bem os olhos na face da
criatura, reconheceu os traços do seu compadre, que apesar de ter pelos no
corpo todo, conservava o mesmo semblante.
_ O compadre embora bastante surpreso não atirasse, tempos depois na
mesma encruzilhada o capelobo não teve a mesma sorte.
O Boi D’água
Lúcio Alves Oliveira
Naquele dia, acordaram todos muito animados. Era o início das férias
escolares e os dois primos, desta história que vamos contar, não viam a hora de
pegar a canoa e ir pescar no rio.
A madrinha do garoto mais novo, dona Izaurina, ficou em casa na cozinha
preparando um delicioso bolo e uma carne de sol. Ela também fazia aquele
cafezinho gostoso e um suco de tamarindo.
Enquanto isso, os dois primos e o padrinho saíram atrás de iscas para a
pescaria. Os meninos estavam ansiosos. Subiria o rio Araguaia, à tardinha, rumo
ao poço da Catita.
Tudo pronto, a madrinha estava com a matula de lanche arrumada. O
padrinho com as iscas e anzóis de todos os tipos no saco. E os primos, com as
varas de pescar e caniços prontos.
Na velha canoa, estavam quatro remos, duas adagas que serviam para
tratar os peixes e uma corda amarrada a uma pedra enorme. Ela serviria de
âncora para atracar a canoa, enquanto pescassem no meio do rio.
A tarde caiu, os primos e os padrinhos partiram animados para a tão esperada
pescaria. Chegando ao poço da Catita, o padrinho ancorou a canoa com a pedra
amarrada à corda. A madrinha pediu que cada um dos meninos ficasse olhando
para os dois pontos na linha do horizonte do rio Araguaia. Precisavam evitar que
algo de estranho se aproximasse, pois havia relatos de pescadores que diziam
que coisas estranhas teriam acontecido ali.
De repente, um dos primos, enquanto devorava um pedaço de bolo, falou:
- Padrinho, olha lá! Tem um tronco grosso de árvore vindo pra cá, em nossa
direção.
Quando o padrinho e a madrinha olharam, o tronco sumiu.
Os dois primos, muito curiosos, continuaram atentos. Fitavam bem os olhos
naquele local. Até que:
_ Olha lá, o tronco de novo.
Desta vez, todos viram quando ele sumiu e tornou a aparecer. E vinha
depressa, rumo à canoa. Todos estavam muito assustados. O padrinho pegou o
facão e cortou a corda. A canoa se desprendeu da pedra e todos, cada qual
pegando um remo, começou a remar depressa, rumo ao barranco do rio
Araguaia.
Apavorados, saltaram da canoa e correram mato adentro. Porém, um dos
primos, caindo ao chegar ao barranco, preferiu subir em uma árvore. Embora
com medo, ficou observando lá do alto e viu quando saiu de dentro do rio
Araguaia, um monstro comprido, com cabeça de boi e quatro chifres na cabeça.
A criatura olhou e cheirou a canoa, andou à sua volta e retornou para as
profundezas do rio Araguaia, sua morada. A criatura já foi vista por outras
pessoas, geralmente pescadores e ficou conhecida pelo nome de Boi d’água.
Até hoje ele vive lá, nesse mesmo lugar, o Poço da Catita.
O segredo da
A serra do Rosa e o porãozeiro
Salvador Batista Barros
Se ajeitando na cadeira, o ribeirinho Salvador, sem muita pausa entre a última
história e a que vai começar agora, conta:
_ Contam que na Serra do Rosa morava seu Teodoro, um pescador que
gostava de contar histórias.
_ Certa noite, um jangadeiro ia passando pela Serra do Rosa à noite, bastante
apressado, pois além da correnteza do rio Araguaia o motor da jangada estava
no máximo. Daí, o jangadeiro, o senhor Teobaldo conhecedor dos relatos de
estranhas visagens e ocorrências sem explicação, conta que sua jangada de
madeira descia normalmente pelo rio quando de repente tudo parou.
_ Parou o motor, a jangada, até mesmo a água do rio. Não se escutava se
quer o chiado de uma muriçoca. As águas do rio paralisaram e parecia terra firme
prendendo a jangada.
_ Seu Teodoro contando apenas com a luz do lampião, começou a sentir que
algo puxava a frente da jangada para dentro do rio.
_ Aos poucos o rio ia engolindo a jangada e no desespero sem ter muito o que
fazer seu Teodoro pegou seu facão e começou a dar golpes na água, para
espantar a assombração. Com isso, a assombração foi-se embora, pois o ferro
do facão cortou os fios da água que prendiam e puxavam a jangada rio adentro
e tudo votou ao normal.
_ O motor do barco voltou a funcionar, as águas do rio seguiram seu curso e
para trás ficava aquele ponto tenebroso da Serra do Rosa, onde muita coisa
estranha acontece.
_ Esse fato não aconteceu apenas com o senhor Teodoro, mas com muitos
outros jangadeiros, pescadores e viajantes que passaram por ali na Serra do
Rosa.
Mãe D’água
Adelmar Borges6
Remando sua canoa, sobre as águas quase paradas,
Descendo o Araguaia rumo ao Travessão,
Um ribeirinho vê sobre uma pedra, sentada,
Distante uma moça lhe acenando com a mão.
Notou que a mesma estava lhe chamando
Para atendê-la, apressado sua canoa remou,
Mas, da pedreira, quando foi se aproximando,
A moça para às águas profundas do rio deslizou,
Pensativo para casa voltou
Ao chegar, a tristeza do filho a mãe percebeu
Impaciente com carinho ela logo perguntou
Meu filho o que foi que contigo aconteceu?
Mãe! Vi uma moça bonita, muito bonita
Enquanto eu remava ela para mim sorriu
Em seus cabelos longos, tinha um laço de fita
Quando me aproximei nas águas ela sumiu.
A mãe lhe ouvira com tristeza tudo que o filho lhe contou
No peito uma forte dor a mãe sentiu
Para não cair, num banco tosco se sentou
Com lágrimas no olhar paciente, ela pediu.
Meu filho, não vá mais ao Travessão:
Veja, a moça que você viu sentada na pedra, é a Iara!
Ela é encantada, seu sorriso é a morte; quando ela canta,
Até a água do rio para.
O tempo passou
E a pobre mãe vivia sempre preocupada
Esquecendo seu pedido, o filho, um dia para pescar o rio desceu.
Mais tarde sua canoa foi encontrada, e o jovem ribeirinho nunca mais
apareceu.
O Boto
Adelmar Borges
Essa era mais uma das histórias que vovó contava
Numa residência ribeirinha quando havia uma festa
Um rapaz simpático, bem trajado chegava sorrindo,
Com um chapéu caindo sobre a testa.
As moças lançava um olhar de simpatia,
Da mais bonita tentava se aproximar
Aos encantos do rapaz a mulher não resistia
Ele, com delicadeza lhe chamava pra dançar.
6 Professor aposentado pela Rede Estadual de Ensino, poeta e contador de histórias. Nascido e
criado em Araguatins, vive há 73 anos construindo sua história e deixando o seu legado de poeta
e cidadão exemplar dedicado à família e ao trabalho. Adelmar pertence a família tradicional
Borges.
A sala, a luz de lamparinas era iluminada.
Assim que o galo cantava anunciando a madrugada,
A multidão barulhenta no terreno se agrupava.
Nesse instante, o estranho da festa saia,
Sem se despedir, com passos lentos para o rio se dirigia,
Ao entrar na água, em boto novamente transformava.
A Boiuna
Lúcio Alves Oliveira1
Eu cresci ouvindo as histórias do meu avô canoeiro acostumado a descer e
subir as correntezas do rio Araguaia, mesmo não acreditando nos relatos
daqueles que juravam ter visto a Boiuna lá para as bandas da ilha do Muricizal.
Sem falar nos relatos de ataques feitos pela Boiuna às embarcações que
transportavam animais silvestres, caças, e melancias.
Assim começou a narrativa:
Dizem que naquele tempo, a Boiuna carregava tudo, sem fazer mal a
tripulação ou afundar a embarcação. Mas, nos dias de hoje, ela vive enfurecida.
Naquela tarde, quando o sol no horizonte começava a beijar as águas do rio
Araguaia, meu avô e eu remávamos próxima a cidade de São Domingo no Pará
quando de repente a uns cem metros avistamos uma serra comprida, cheia de
ondulações.
Chegando mais perto, vimos que não era uma serra, mas uma enorme
serpente, a famosa Boiuna que repousava parte de seu corpo numa ilha,
enquanto sua cabeça tocava malmente o barranco do rio.
Ao perceber o que estava à nossa frente, deixamos que a correnteza
arrastasse a canoa no remanso silencioso do rio Araguaia até que retomados do
espanto começamos a remar em direção a cidade de Araguatins no Tocantins.
Horas depois a noite caiu de vez, e ficamos iluminados apenas pelo clarão da
lua e fomos seguindo rio abaixo. Passamos pelo temido Travessão até que
esbarramos em um tronco grosso que boiava na água impedindo a canoa de
seguir viagem.
Vovô depois de cutucar o tronco com o remo sentou se na canoa esmorecido
e disse: _ Meu filho! Isso não é um pau, mas a ponta do rabo da Boiuna.
O vovô ficou em pé na canoa, fez um gesto pedindo silêncio, pegou o remo,
empurrou o rabo da serpente para baixo e pediu que eu remasse para que a
canoa passasse por cima, e seguíssemos em frente rumo ao Cais do Porto.
Acredite! Isso não é história de pescador.
O Capelobo da Encruzilhada
Lúcio Alves Oliveira
Existem várias versões relacionadas as visagens do Capelobo, em diversos
lugares do Brasil. Em Araguatins não é diferente. No povoado da Água Roxa
haviam várias ocorrências incluindo a aparição de um monstro cabeludo
assombrando as famílias da localidade.
O senhor Lúcio começa dizendo:
_ As mulheres e moças não tinham mais coragem sequer de ir à missa ou ao
culto à noite, com medo de serem atacadas pela criatura.
_ Certa noite, ao cavalgar pela estrada a caminho de sua casa, um homem
destemido que não se deixava amedrontar pelas histórias contadas no povoado
da Água Roxa, seguia seu destino quando avistou ao longe na encruzilhada, um
vulto estranho. Não conseguindo distinguir se o que via era um homem ou um
1 Lúcio Alves Oliveira é Pedagogo e poeta, atua na Rede Municipal de Ensino de Araguatins como diretor
do departamento de Transporte Escolar na Secretaria Municipal de Educação. É filho de Manuel Alves da
Silva e Albertina Alves de Oliveira, nascidos e criados no município de Araguatins, onde também criaram
todos os filhos.
cachorro, pois tal criatura hora deitava se rolando pelo chão, hora se levantava
fazendo movimentos brutos como se estivesse rasgando alguma coisa.
_ Imaginando que talvez aquela criatura estivesse precisando de ajuda, o
homem puxou a rédea do cavalo diminuindo suas passadas, e aos poucos foi se
aproximando com os olhos fitados naquela criatura que sem perceber a
aproximação do cavaleiro, foi então surpreendido ao escutar:
_ Vire-se ou eu atiro.
_ A Criatura assustada se virou de uma só vez suplicando:
- Por favor, compadre, não atire. Sou eu!
_ Ouvindo isto o homem que estava a cavalo fitando bem os olhos na face da
criatura, reconheceu os traços do seu compadre, que apesar de ter pelos no
corpo todo, conservava o mesmo semblante.
_ O compadre embora bastante surpreso não atirasse, tempos depois na
mesma encruzilhada o capelobo não teve a mesma sorte.